O momento em que vivemos no desporto assusta-me, parece que esquecemos o grande autor Jacques Personne do livro “Nenhuma medalha vale a saúde de uma criança”. Não podemos esquecer que a saúde não está só no desenvolvimento físico, mas que a parte cognitiva é uma das mais importantes para as suas acções individuais e sociais.

Todos nós sabemos que o pior acontecimento na aprendizagem é a “contradição”. Ter opções de escolha estimula a tomada de decisão, a criatividade, a imaginação, desenvolvendo também o sentido de responsabilidade. Agora ter duas certezas opostas, ensinadas por alguém que está cheio da sua razão e que não aceita opiniões, parece-me o maior erro de qualquer educador/professor/pai.

Não obstante da contradição transmitida aos educandos, muitas das vezes estes ditos educadores esquecem que têm responsabilidades sociais directamente implicadas na estruturação da personalidade destas pessoas a quem tentam enganar com a sua pouca competência, pedagógica e educativa. Ganhar, pode ser o mais importante para todos, mas ganhar à custa de uma má formação psicossociológica e incrivelmente fraca em termos da justificação do respeito competitivo, parece-me um engano demasiado óbvio.

A competição pode levar os treinadores a pedirem coisas incrivelmente ‘estúpidas’ e com pouca consistência pedagógica. No entanto, parece-me importante, aqueles que ensinam, não se esquecerem que, do outro lado, estão sempre mais pessoas e mais aprendizes e que esses aprendizes um dia podem vir a ensinar, ou a acusá-los daquilo que lhes tentaram ensinar erradamente.

Para ganhar não é preciso: ser ‘manhoso’, ‘bater nos outros sem o juiz ver’, ‘cometer uma falta sem que ninguém veja’, ‘lesionar um adversário sem que seja sancionado’, ‘mandar bolas à cabeça dos guarda-redes’, ‘chamar nomes ao adversário enquanto o árbitro está de costas’. Para ganhar é importante: estar concentrado nas tarefas que o treinador preparou para o atleta, tomar as decisões certas em vez das erradas, ter confiança em si mesmo, superar a frustração da falha e, mais que tudo, treinar e repetir sempre tudo aquilo que ainda não se sabe fazer bem, seja a nível físico ou psíquico. Muitas vezes ter a liberdade de questionar é a melhor forma de construir jogadores e atletas sem dúvidas, nem hesitações.

Um aplauso para quem gosta da competição feliz e justa!

 

Ricardo Cardoso
Psicólogo
Curso de pós-graduação em psicologia desportiva e do treino – Vigo, Espanha