Golo deixou em festa falange benfiquista da terra natal. É fruto “de muitos sacrifícios”, diz o pai, ex-jogador da Académica
Castanheira de Pera, vila esquecida no interior norte do distrito de Leiria, é uma terra de benfiquistas – ou não fosse casa da filial n.º 10 do emblema da águia. Lá, como acontece nos lugares pequenos, estão todos a torcer” pelo mais famoso filho da terra, João Carvalho, caso raro de um castanheirense a aventurar-se pelo futebol profissional. E, anteontem, o médio do Vitória de Setúbal, de 20 anos, deu-lhes uma grande alegria: marcou o golo do empate (1-1) em casa do FC Porto, que mantém o Benfica na liderança da I Liga.
Tozé, pai de João Carvalho e também ex-futebolista, é o cicerone do DN numa breve viagem pelas raízes do médio criativo, com pinta de Rui Costa, que ajudou o Vitória a conservar a invencibilidade em 2016/17 contra dragões [ver caixa]… e, de caminho, evitou uma ultrapassagem na frente da I Liga, antes do clássico. “Aqui há mais benfiquistas do que sportinguistas… mas junta-se tudo em prol do João. Todos vestem a camisola do João”, conta Tozé, confirmando que o golo de domingo – a bola picada sobre Iker Casillas, ao minuto 56 – foi vivido em festa pela falange encarnada da terra natal do jogador, que está emprestado pelo Benfica ao clube sadino.
Foi por ali, no Sport Castanheira de Pera e Benfica, que João Carvalho deu os primeiros pontapés na bola – quando Tozé era diretor do clube, onde terminou a carreira, após largos anos (entre 1985 e 1995) com a camisola da Académica. E logo deu nas vistas. “Tinha 6 ou 7 anos e jogava particulares contra miúdos de 10 anos. Embora eles fossem maiores, notava-se uma diferença enorme”, recorda o pai.
O jeito levou-o a captações na Luz. João Carvalho ficou. E não mais deixou o emblema da águia, até ser emprestado ao Vitória de Setúbal, em janeiro. “Até aos 11/12 anos tivemos de andar para trás e para a frente, para levá-lo a competições. Depois ficou na Caixa Futebol Campus [o centro de estágio e formação do Seixal]”, recorda o pai. “Foram muitos anos de muitos sacrifícios para chegar onde está”, sublinha.
Agora, o médio-ofensivo começa a recolher os frutos desses anos de formação – ao lado de figuras como Renato Sanches e Gonçalo Guedes. “Fui ver o jogo [no Dragão]. O treinador do Vitória disse tudo: é preciso uma pontinha de sorte. Foi uma estrelinha que apareceu”, afirma Tozé, “muito feliz” por o filho ter “marcado o golo do empate e permitido que o FC Porto não passasse para a frente do Benfica”. É uma história para contar aos netos: “Ainda para mais, tendo marcado ao Iker Casillas”, frisa o antigo jogador.
A satisfação é natural: João Carvalho – vindo do Benfica B e internacional por Portugal em todas as seleções jovens, dos sub-15 aos sub-21 – afirmou-se depressa no Vitória e na I Liga e até há quem o compare a uma das maiores lendas das águias, Rui Costa. “Falam muito do Rui, que tem mais ou menos as mesmas características. Eu penso que jogam da mesma maneira… mas há sempre qualquer coisa de diferente. Ele ainda está a crescer”, diz Tozé, tentando pôr travão na euforia. Para já, o objetivo do jovem é ter oportunidade do treinador do Benfica, Rui Vitória, na próxima época. “Não sei se o futuro passa por lá ou não. Ele tem contrato até 2021”, explica o pai.
No entanto, aconteça o que acontecer, em Castanheira de Pera – sede de um município com cerca de 3000 habitantes e sem grande história no futebol (até o Sport local está sem equipa sénior há cinco temporadas) – o entusiasmo é natural. E vincando as diferenças para o filho – “somos opostos como jogadores; eu era canhoto e tinha muita agressividade” -, Tozé só deseja “que o futuro lhe sorria”: “Já que o pai não conseguiu chegar tão longe [somou escassas presenças na I Liga, ao serviço da Académica e do Leça], ainda bem que ele está a conseguir.”
Diário de Notícias